Saturday, October 31, 2009




Estou lendo o livro "A filha do canibal", da escritora espanhola Rosa Montero. O livro começa nos transportando para um cenário inusitado: a porta vai-e-vem do mictório do aeroporto, por onde Ramón, marido da protagonista Lucía, entra... e não volta. De lá, ele simplesmente evapora, desaparece (alguém já teve vontade de escapar assim?). Algumas páginas adiante, refletindo sobre a ausência do marido, Lucía descreve com maestria a vida de 99,99% dos casais da vida real:

"Mas nessa noite, na cama, aturdida pela incompreensibilidade das coisas, me surpreendi ao sentir uma dor que não experimentava desde muito antes: a dor da ausência de Ramón. Afinal, fazia dez anos que vivíamos juntos, dormíamos juntos, suportávamos nossos roncos e nossas tosses, os calores de agosto, os pés congelados no inverno. Eu não o amava, ele até me irritava, havia muito tempo que eu analisava a possibilidade de me separar, mas ele era o único a me esperar quando eu voltava de viagem e eu era a única a saber que ele friccionava minoxidil na careca todas as manhãs. A cotidianidade tem esses laços, a intimidade do ar que se respira a dois, do suor que se mistura, a ternura animal do irremediável. E naquela noite, insone e desassossegada na cama vazia, compreendi que precisava procurá-lo e encontrá-lo, que não podia descansar até saber o que lhe havia acontecido. Ramón era responsabilidade minha, não por seu meu homem, mas meu costume"

Pro trecho, cabe até trilha sonora. Chico Buarque: "Vão viver sob o mesmo teto, até que a morte os una. Até que a morte os una..."

A todos, desejo o 0,01%!


20 comments:

Didi said...

Realmente muito bom mesmo a analise dela. Não tem como fugir disso né. Tbem desejo a vc o 0,01%

iMarty Turbo said...

muito bom!!

Um cara said...

Não tinha ouvido falar nesse livro, pelo tema não faz meu tipo, o que não quer dizer que seja ruim, muito pelo contrário, gostei do trecho e tbm da trilha que vc sugeriu. Desejo-he o 0,01% também.

Alexandre said...

Olá, Sabrina.

Paciência não tem segredo. É um exercício. Um exercício bem dificil... rsrsrsrs
Bjoooooooooo

Rosa said...

"Eu não o amava..."
Eu acredito que ela amava o Ramon, sim.Eu acho que as pessoas não sabem o que é amor.Por isso não conseguem identificar quando amam alguém.
Vejo gente tão mais experiente que eu associando um sentimento constante como o amor com o frisson do tesão.Uma coisa não tem nada a ver com a outra, a não ser que eu use uma para melhorar ou piorar a outra.
enfim...
Desculpe Chico, mas é até que a morte os separe!
ps:QUER MAIS AMOR DO QUE DIVIDIR AS CONTAS, O TÉDIO E A VONTADE MÚTUA DE ASSASINATO? QUER MAIS AMOR DO QUE SENTIR FALTA DA PESSOA QUE MAIS SE TEM RAIVA?

Rosa said...

te linkei!

Sabina Insustentável said...

Ei, Rosa!
bem vinda ao blog! Adoro comentários como o seu, grandeeees!!! Significa que leu e refletiu, é o que tento ao escrever aqui!!! E melhor ainda, me linkou! rsrsrsrs
Me preocupei com o trecho q vc fala sobre a vontade mútua de assassinato! Meus olhos saltaram, na verdade! Espero que esteja falando metaforicamente! rsrsrsrs
Volte sempre!
Sabina

Anonymous said...

Que texto brilhante!! (e sua interpretação dele tb) Realmente é o que passam 99,9% dos casais, mas não passam isso por imposição, e sim por comodismo mesmo, porém é perfeitamente possível fazer parte desse 0,01%, só depende da gente, mas pra isso basta ter coragem, você que está lendo isso agora teria coragem de terminar um relacionamento que mesmo não sendo ruim já caiu na mesmice e arriscar tudo de novo? Dizem que podemos ser fantásticos mesmo sendo bonitos mais ou menos, um atleta mais ou menos, um filho mais ou menos e até um pai mais ou menos, mas se vc AMAR mais ou menos corre o imenso risco de ser uma pessoa mais ou menos, aí complica... Bjão Pats! - Rato RAstafari -

Sabina Insustentável said...

Alexandre,
Quem sabe quando balzaquiana, daqui a 3 anos, encontre um bocadinho mais da tal paciência? Rsrsrsrs

RR,
Também acredito na exceção. Fujamos à regra: 0,01%!!!
Qto a sua pergunta se arriscaria... eu arriscar? Sempre! Detesto comodismo, rotina e o abuso que advém dela. Mas daqui pra frente acho que tenho envergadura para começar e recomeçar direito com a mesma pessoa.

Beijocas!!!
Sabina

Unknown said...

Sabinaaaaaa, minha paixão!
Fica comigo, entraremos no 0,01%

=p

Tom Correia said...

Belo trecho, grande dica.
Notei que o post mobilizou o pessoal, um tema que nos diz respeito...
Comment é breve, mas refleti também sobre o que li.
Beijão.

Lalli Carvalho said...

por isso eu prefiro ser sozinha!

Anonymous said...

Sabina, minha amiga insustentável. Faço minhas as palavras da Rosa. Só retiro o assassinato porque não mato nem barata, hehehe! Beijos de perseguidor de blogs. Manoel.

Anonymous said...

Sabina, como você está definitivamente de volta já posso postar umas coisinhas da Martha Medeiros prá você, né? Beijokas. Manoel.

X said...

Nossa eu também desejo o 0,01%

G.M. said...

Cara, é tão triste saber que as coisas sempre chegam nesse ponto. As vezes penso que é melhor nem iniciar nada, pra não ter que chegar nesse desencanto. Depois acontece um troço terrível pra chacoalhar agente... (no meu caso, o outro, pq eu sou fácil de satisfazer... hehe)
enfim...
parabéns Pati.

Unknown said...

menina, textinho baum pra parar e refletir... a tal da convivência é danada pra confundir sentimentos e amornar a mais quente das relações. Bichinho complicado é o tal do "costume"... a gente acha que o amor num é mais amor, que é só apego emocional... e vai levando uma vidinha branda, em banho maria... Uma sumida a La Ramón é boa pra quando há essas dúvidas, mas não acho que seja necessária... o bom mesmo é estar perto!
Quero casar simmmm, mas fazer parte do 0,01% que não se entrega à rotina.. Tarefa fácil? Num sei, vou tentar!
Amooo seu blog!!!!!!!!!!!!

Rosa said...

AH! Sabina ( um século depois rs) era metaforicamente sim.
rsrsr

Bê Sant Anna said...

Sabina, não concordo com o comentário.
Já vivi o casamento e sei bem como é. Sei que 99,99% é muito pessimismo. Continue desejando o 0,01%, porque ele é diferente do que foi descrito, ou escrito pela autora... Isso vai fazer você encontrar com esse avesso mágico que existe, pode existir, e depende muito mais da gente do que de simples chavão, estatísticas, pessimismo, conformismo, enfim.
Eu acredito em você. Você acredita?
Bê ijo carinhoso e até breve.

Sabina Insustentável said...

Ei, Manoel!!! Martha? Pode postar sempre! ;)

Grazi e Tati, obrigada pelos comments, amei! Grazi, vc está mto pessimista e desiludida, amiga! Nada de extremismos kkkkkkkkk

Tata, disse tudo: "Tarefa fácil? Num sei, vou tentar!"

Rosa, UFA! Que alivio... rs

Bê, se eu acredito em mim? Sim. Em relacionamentos que dão certo? Respondo com a frase de Tati: "Tarefa fácil? Num sei, vou tentar!"